quarta-feira, 30 de junho de 2010

QUESTÃO DE HUMANIDADE

Aceitemos então que estamos sozinhos e, a partir daí, façamos a nova descoberta de que estamos acompanhados – uns pelos outros. Quando pusermos os olhos no céu estrelado, com a furiosa vontade de lá chegar, mesmo que seja para encontrar o que não é para nós, mesmo que tenhamos de resignar-nos à humilde certeza de que, em muitos casos, uma vida não bastará para fazer a viagem – quando pusermos os olhos no céu, repito, não esqueçamos que os pés assentam na terra e que é sobre esta terra que o destino do homem (esse nó misterioso que queremos desatar) tem de cumprir-se. Por uma simples questão de humanidade.
José Saramago, In Deste Mundo e do Outro, Ed. Caminho, 3.ª ed., pp. 216-217


segunda-feira, 14 de junho de 2010


"A certa altura do filme Crimes e Pecados, o personagem interpretado por Woody Allen diz: 'Nós somos a soma das nossas decisões'. Essa frase acomodou-se na minha massa cinzenta e de lá nunca mais saiu. Compartilho do ceticismo de Allen: A gente é o que a gente escolhe ser, o destino pouco tem a ver com isso. Desde pequenos aprendemos que, ao fazer uma opção, estamos descartando outra, e de opção em opção vamos tecendo essa teia que se convencionou chamar 'minha vida'. Não é tarefa fácil. No momento em que se escolhe ser médico, se está abrindo mão de ser piloto de avião. Ao optar pela vida de atriz, será quase impossível conciliar com a arquitetura. No amor, a mesma coisa: namora-se um, outro, e mais outro, num excitante vaivém de romances. Até que chega um momento em que é preciso decidir entre passar o resto da vida sem compromisso formal com alguém, apenas vivenciando amores e deixando-os ir embora quando se findam, ou casar, e através do casamento fundar uma microempresa, com direito a casa própria, orçamento doméstico e responsabilidades. As duas opções têm seus prós e contras: viver sem laços e viver com laços... Escolha: beber até cair ou virar vegetariano e budista? Todas as alternativas são válidas,Mas há um preço a pagar por elas. Quem dera pudéssemos ser uma pessoa diferente a cada 6 meses, ser casados de segunda a sexta e solteiros nos finais de semana, ter filhos quando se está bem-disposto e não tê-los quando se está cansado. Por isso é tão importante o auto conhecimento.P or isso é necessário ler muito, ouvir os outros, estagiar em várias tribos, prestar atenção ao que acontece em volta e não cultivar preconceitos. Nossas escolhas não podem ser apenas intuitivas, elas têm que refletir o que a gente é. Lógico que se deve reavaliar decisões e trocar de caminho, ninguém é o mesmo para sempre. Mas que essas mudanças de rota venham para acrescentar, e não para anular a vivência do caminho anteriormente percorrido. A estrada é longa e o tempo é curto. Não deixe de fazer nada que queira, mas tenha responsabilidade e maturidade para arcar com as conseqüências destas ações. Lembrem-se: suas escolhas têm 50% de chance de darem certo, mas também 50% de chance de darem errado. Às vezes, é preciso esquecer um pouco a pressa e prestar mais atenção em todas as direções ao longo do caminho. A pressa cega os olhos. E deixamos de observar tantas coisas boas e belas que acontecem o nossoredor. Às vezes, o que precisamos está tão próximo... Passamos,olhamos, mas não enxergamos. Não basta apenas olhar. É preciso saber olhar com os olhos, enxergar com a alma e apreciar com o coração. O primeiro passo para existir é imaginar. O segundo é nunca se esquecer de que querer fazer é poder fazer,
Basta acreditar."
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Pedro Bial

quarta-feira, 9 de junho de 2010


fe.li.ci.da.de
1. qualidade ou estado de feliz; ventura, contentamento.
2. sucesso; êxito.
O que me faz feliz são momentos. O que me dá imensa paz interior é observar o pôr-do-sol do meu quarto, da varanda do apartamento ou voltando da faculdade ao som de qualquer trilha sonora que me comova e agite meu cérebro. Há tantos momentos supérfluos que podem render aquele pensamento de estou-tão-feliz-que-poderia-morrer-agora. Você pode sentir tamanha sensação de benção em pequenos detalhes, no momento em que saboreia sua torta preferida de morango, qualquer outro doce delicioso ou apenas em estar na companhia de quem gostaria exatamente onde gostaria. Cazuza já dizia: “ás vezes, fico triste, mas não consigo me sentir infeliz”. Sinto o mesmo. Não consigo me olhar no espelho e me chamar de infeliz. Sou grata por tudo que tenho e já tive. Reclamo do calor, trânsito, das pessoas, comidas, barulho de obra, professores carrascos, fracassos amorosos, mercado de trabalho, mas juntos não são suficientes para me sentir infeliz. Tristeza e infelicidade são bem diferentes e talvez a pessoa que me disse que ninguém é feliz e sim, está feliz não saiba diferenciá-los.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

POR NÃO ESTAREM DISTRAÍDOS
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"Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos."
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Clarice Lispector."Para não esquecer"



"A cidade lá fora, com gentes falando sempre alto demais, sem parar, entrando e saindo de lugares, bebendo, comendo coisas, pagando contas, dançando alucinadas, querendo ser felizes antes da segunda-feira: urgente".

Caio F.


Não se expurga um câncer sem matar células inocentes.
(Fernanda Young)